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ARTIGO: BRINCADEIRA MALDOSA NÃO É LEGAL
ARTIGO
Publicado em 19/06/2021

O médico brasileiro (e gaúcho) que foi detido no Egito por acusação de assédio sexual a uma vendedora, após ter postado um vídeo em que insinua uma conversa de cunho sexual com a mulher sem ela saber, tentou justificar sua atitude alegando que era uma brincadeira e que costuma ser um “brincalhão”. Sua família também defendeu essa tese ao passo que pedia a sua soltura. Passado alguns dias, o médico fez uma transmissão pela internet reconhecendo que teria cometido um erro. Chorou e pediu desculpas pelo ocorrido. Chegou a dizer que estava disposto a pagar o necessário pelo que considerou um erro e uma infelicidade sua.

Em 2019, um famoso MC também foi acusado de humilhar uma criança após gravar um vídeo fazendo chacota de sua aparência. No vídeo, a menina parece estar desconfortável com a situação mesmo sem ter entendido o que o cantor dizia sobre ela, já que o brasileiro estava em outro país. O MC também se defendeu das acusações alegando ser uma brincadeira. Em ambos os casos que citei, os acusados fizeram o registro com o fim de alcançar o riso dos seus seguidores. O retorno, porém, foi mais realista - fizeram algo desprezível e nada digno de curtidas.

Casos como esses diariamente são constatados mesmo sem tamanha repercussão. Nem sempre há uma retratação dos autores. Alguns persistem na prática, inclusive. Outros, mesmo sendo apontados, continuam a negar que o feito tenha sido uma maldade. Alegam sempre a brincadeira, como se o brincar justificasse usar o outro para a zombaria. O brinquedo, nesses casos, não é um objeto para tal fim, mas sim o outro. Uma pessoa é usada pelo “brincalhão” para sua própria manipulação “divertida”. Caçoar do outro aproveitando uma condição de diferença que o torna indefeso é covardia. É a lógica do “bully”, que traduzido significa “o valentão’’ e do qual se originou a palavra “bullying”. 

O valentão sempre se ocupa de alguém que está, por alguma condição, mais vulnerável do que ele. Só é valente ao custo dessa vulnerabilidade, pois quando o jogo inverte, ele chia, não aguenta e chora. De certa forma, experimenta um pouco do próprio veneno quando se retrata. Porém, nesse caso, não é uma vítima indefesa, mas sujeito responsável pelos próprios atos, dos quais não pode nem escapar, já que fez questão de fazer o próprio registro. E as redes sociais ajudam dar a dimensão do erro cometido à medida que a maioria reprova a maldade. Se houvesse uma balança mais equilibrada a favor ou contra o indivíduo, provavelmente não veríamos retratação, a não ser que a Justiça assim determinasse impositivamente.

Os casos em questão nos deixam um aprendizado. Primeiro, isso sempre acontece entre os humanos, o que não justifica a prática como sendo legal. Segundo, coibir passa efetivamente pelo reconhecimento da maioria de que isso não é legal. Terceiro, um tratamento adequado pode gerar resultados efetivamente pedagógicos no sujeito praticante e, por consequência, em quem o segue. É certo que os casos citados resultaram num arrependimento dos acusados porque seu discurso de brincadeira não se sustentou diante da opinião da maioria das pessoas. É a sociedade intervindo no indivíduo para provar que uma brincadeira tem consequências sérias quando se toma um humano como brinquedo. Que usar o outro para diversão, além de perigoso, não é legal e nem correto. Retratar-se arrependido dá a oportunidade para o sujeito aprender de uma forma reparadora, pois pode sentir algo similar ao que fez o outro sentir. Isso sem precisar apelar à humilhação injusta.

Jonas Freier Ribeiro/Especialista em Avaliação Psicológica e trabalha como psicólogo clínico na Prefeitura Municipal de Salto do Jacuí.

 

 

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