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ARTIGO | AMOR DE MÃE
06/05/2021 22:58 em ARTIGO

Nascemos cobrando a existência de uma mãe. Não necessariamente a nossa própria (melhor que seja!), mas uma mãe qualquer capaz de nos cuidar e nos amar. E cá pra nós: é preciso uma boa dose de amor para dispensar tanta dedicação ao humaninho que acabou de chegar ao mundo. Um bebê clama por alguém que esteja ali disponível para si. Vir ao mundo é apavorante. Se não tiver alguém ali para amenizar as cólicas dessa experiência, o choro não vai parar e o trauma será ainda maior. 

Uma criança convoca a função materna. Não significa que isso baste para ligar uma tecla interna na mulher parturiente. Não há uma “Hora de Morfar” ao estilo Power Rangers. É uma dinâmica mais do improviso do que com manual de regras. As regras básicas existem, mas não são elas que definem uma mãe. São básicas demais para dizer todo o sentido de uma maternidade. Como uma mãe deve amar seu filho ou sua filha? Tente dar uma resposta e perceberás que faltarão palavras. Por mais que se diga, falta. Não há dito que dê conta de tanta complexidade. Amor de mãe é assim: por mais que se faça presente e atuante, falta.

E precisa faltar mesmo. O amor de mãe idealizado como uma entrega incondicional da Super Mulher-Mãe é um mito. É uma idolatria. Não é possível anulação de si mesma para exercer a maternidade. Ao contrário, é preciso estar ali como si mesma para fazer suficientemente bem sua função. É melhor estar faltante do que tentar estar plena e acabar por fazer uma ausência de fato. Uma mãe não ama incondicionalmente. Ama por também desejar ser amada.

Não pedir nada em troca do amor que se dispensa é não amar. Pelo menos não no amor entre humanos. O amor quer o outro. Não há concessões. O amor de mãe incondicional é uma idealização ultrajante, pois coloca as mulheres numa posição não desejante. Ou seja, querem das mulheres mães um amor subalterno, um “ame sem precisar ser amada”. Esquece-se de que uma mãe é sempre uma mulher. Na exigência de um amor incondicional, conjura-se para elas: “me ame, mas não seja amada”. E uma mulher, mesmo mãe, quer viver seus amores. Quem espera da mulher que ela seja a Super Mulher-Mãe pouco ou nada faz para auxiliar ela no exercício de sua maternidade.

Não é por não ser incondicional que seja um amor menor. Na real, é por ser assim que é um verdadeiro amor. É um amor real. É o amor possível. É o que basta para um bebê sedento de leite tanto quanto de amor. Não é por termos sido amados enquanto pouco ou nada podíamos dar em troca que nossa mãe não esperava alguma correspondência. O amor é relacional por natureza. E isso a criança começa a aprender logo que alguém faz presença para lhe amar. Um humano com amor sozinho é apenas um narcisista. Quer subjugar o outro a amá-lo forçosamente. Que amor advém da tirania? O anseio por um amor incondicional deve ser direcionado não para uma mãe. É uma demanda pesada demais para qualquer pessoa. Quem poderia ter tamanho amor? Só quem não precisasse demandar amor de ninguém por ser Ele mesmo o amor.

Jonas Freier Ribeiro - Psicólogo Clínico trabalha na Prefeitura de Salto do Jacuí

 

 

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