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DIZ CONCORDANDO - Jonas Freier Ribeiro
ARTIGO
Publicado em 24/07/2021

CANCELAMENTO REALIZADO COM  SUCESSO!

Certa vez ouvi uma mãe contar que tinha ficado muito aflita com o que tinha ouvido de seu filho pequeno. Após uma repreensão dela, o menino ficou muito irritado e disparou: “Queria que você fosse para outro mundo!”. Ela ficou chocada com aquilo a ponto de questionar a sua própria função materna. É difícil suportar a frustração de um filho, mas às vezes a irritação deles pode demonstrar que realmente se está agindo como bons pais. Situações desse tipo são mais comuns do que imaginamos. É dessa mesma dinâmica que surgem as ordens de mandar alguém para aqueles “outros lugares”.

Aquilo que recentemente tem sido chamado de Cultura do Cancelamento faz referência às ações de ostracismo combinado pelas pessoas para ignorarem totalmente uma pessoa e o que ela produz, principalmente seu perfil e seus conteúdos nas redes sociais. Normalmente, tal condenação vem a partir de uma atitude indecorosa dessa pessoa. Há poucos dias, o DJ Ivis foi alvo de cancelamento. Não foi para menos, sua ex-mulher divulgou vídeos em que ele aparece agredindo-a violentamente. O DJ teve parcerias desfeitas e suas músicas foram excluídas das plataformas digitais, além de outras sanções. Nessa hora, ninguém quer estar associado ao acusado.

Se pensarmos que a lógica do cancelamento pode ser a mesma da criança que quer mandar a mãe que a frustrou para um mundo distante, veremos que o cancelamento é algo que fizemos com as pessoas em diversos aspectos. Seria nossa forma primitiva de lidar com o outro que nos frustra ou incomoda. É desse ódio básico que vem o cancelamento social, ou seja, aquele que a civilização impõe aos seus integrantes desviantes. As prisões, por exemplo, estão aí como um local reservado para o cancelamento daqueles que se mostraram incoerentes com os valores sociais ou que reagiram maldosamente à frustração de viverem limitados pelos outros.

Nesse sentido, o cancelamento tem sua sustenção no ódio, seja ele individual, como o sujeito que manda alguém à merda, ou coletivo, como por exemplo quando a sociedade trata aqueles que despertaram seu ódio através de algum ato delituoso. Alguns movimentos de cancelamento na internet também estampam uma luta contra os ditos “discursos de ódio’’, fazendo uso do próprio ódio. Paradoxalmente, usamos o ódio para lidarmos com o ódio alheio. Como na Era Digital muitas pessoas vivem de conteúdos digitais na chamada “presença digital’’, os grupos que cancelam fazem no digital o que já fizemos no real com a prisão - tiram a pessoa de circulação.

Não acho que há como evitar os cancelamentos. Está em nós o ódio básico que quer cancelar o outro que nos frustra, que se manifesta diferente ou que nos fere com violência. Mandar o outro à “puta que o pariu”, à merda, tomar naquele lugar específico, pra Cuba e até um “Ele Não’’ são demonstrações do ódio básico que quer cancelar o outro. Partem dessas expressões as ações e movimentos que encontram outros com o mesmo sentimento de desafeto, os quais vão colecionando sentimentos para então os transformarem em cancelamento efetivo. O ponto máximo de um cancelamento é a morte do outro. Zerou de fato. Alguns chegam a vibrar: “CPF cancelado com sucesso!”.

 

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