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DIZ CONCORDANDO
03/07/2021 09:45 em ARTIGO

A CAÇADA TERMINOU!

Na semana passada, finalizei meu texto dizendo que a guerra entre Lázaro e a Lei continuava. Na última segunda-feira, porém, tudo terminou como uma grande caçada. Em confronto com a força policial, Lázaro acabou sendo morto. Não houve rendição. Quase sempre este é o fim daquele que leva a cabo o seu desejo de ver até onde é capaz de levar uma fuga da Lei. A interdição em um sujeito chega nem que seja pela morte. Às vezes é só uma questão de tempo. Outras vezes, entretanto, o próprio sujeito cansa da suposta fuga e põe em si mesmo uma interdição. Não foi o caso.

Assim como toda a informação na Era Digital, logo choveram as notícias sobre o caso, vídeos e fotos do estado em que o criminoso ficou, de como foi colocado na ambulância e como chegou ao hospital. As opiniões do público foram diversas. Houve quem aplaudiu sua morte. Quem achou que a punição deveria ser em vida, mesmo que doída. Houve também quem se compadeceu. Numa situação como essa, normalmente há quem pense: “Ele é um humano, não importa o que fez!”. Mas há também quem pense: “Importa o que ele fez, mesmo que seja um humano. Que pague com a mesma moeda!”.

Na barbárie, nada mais importa além do que se quer, seja como indivíduo ou grupo. A barbárie está em nosso íntimo. É uma natureza que se opõe a uma rendição. Civilidade é justamente uma certa capacidade de conter esses instintos ferozes que habitam em nós. Tais instintos não respeitam nem mesmo a farda, seja a que o sujeito veste ou a que está no outro. Tudo vira uma questão animalesca e pouco importa qualquer humanidade no sentido mais pleno do termo. O outro é desumanizado para que o objetivo seja atingido. Criamos mecanismos que mantêm a ordem para haver civilidade, mas podemos ser bárbaros no tratamento daqueles que deixaram de ser civilizados.

Lembro-me de um dilema ético proposto por minha professora de Filosofia durante a graduação: chegando um criminoso com quadro de saúde instável em um hospital e um policial com quadro estável, quem deveria ser atendido primeiro? A maioria da turma, pelo que lembro, julgou que o policial deveria receber o primeiro cuidado. Logo o debate foi feito. Pela ética, não importa o que fez o sujeito ou quem ele é, mas seu estado de saúde é que determina o lugar na fila de emergência. Todos se tornam apenas pacientes. Talvez seja por isso que os médicos parecem frios no tratamento. Se eles olharem como humanos sem seus jalecos, tenderão a pensar como a maioria da minha turma, provavelmente.

Uma questão como esta não é fácil de elucidar quando há armas em punho. A situação real não permite reflexão filosófica. Não é fácil decidir se o sujeito deve ter todos os seus direitos constitucionais respeitados quando ele está apontando a arma para outra pessoa. Inclusive, para onde vão os direitos do policial quando o outro lhe aponta a arma? Se não se deve desumanizar o criminoso por ser assim, deveria se desumanizar o policial por estar de farda? São questões de difícil conclusão em uma situação real. No instante em que já houve afronta à civilidade, é difícil haver debates sobre qual melhor ação cabe ao caso e tudo beira a uma grande caçada igual aos tempos primevos. Tomara que a civilidade vença a barbárie de todos nós.

Jonas Freier Ribeiro 

Especialista em Avaliação Psicológica e trabalha como psicólogo clínico na Prefeitura Municipal de Salto do Jacuí.

 

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