A Nissan apresentou oficialmente o Kait, um SUV de porte médio desenvolvido inicialmente para o mercado brasileiro e que chega com a missão de substituir o Kicks Play, versão do modelo lançada em 2016 e que se tornou um dos maiores sucessos da marca no país. O Kicks original consolidou-se como um veículo confiável para a família brasileira e segue bem aceito até hoje, mas sai de cena para dar lugar a uma nova estratégia comercial e industrial da montadora japonesa.
Em abril de 2025, a Nissan lançou a segunda geração do Kicks, modelo que passou por duas semanas de testes em CM do CP. O veredito foi claro: trata-se de um produto moderno, com desempenho que estimula a condução, design atrativo e elevado padrão tecnológico. Construído sobre a plataforma global CMF-B da aliança Renault-Nissan, o novo Kicks apresenta excelente estabilidade direcional e lateral, além de avançados sistemas de segurança que o colocam em destaque no segmento.
No entanto, toda essa evolução teve impacto direto no preço. A versão de entrada Sense parte de R$ 170 mil, enquanto a configuração topo de linha Platinum supera os R$ 200 mil. Para boa parte da classe média brasileira, trata-se de um valor difícil de absorver, o que abriu espaço para a Nissan reposicionar sua linha de SUVs com o lançamento do Kait.
O objetivo do Kait é claro: vender em volume e garantir presença em um dos segmentos mais disputados do mercado nacional. Com a saída do Kicks Play, caberá ao novo modelo enfrentar concorrentes diretos como o Fiat Pulse e até mesmo o BYD Dolphin Mini — que, embora não seja um SUV, oferece versatilidade e preço competitivo. Ao mesmo tempo, o lançamento ocorre em um momento delicado para a Nissan, que enfrenta um processo de recuperação financeira e precisa reafirmar sua relevância global com produtos de retorno rápido.
O Kait faz parte da estratégia global “ARC”, plano que prevê o lançamento de 30 novos modelos no mundo a partir de 2026, com o objetivo de recolocar a Nissan no caminho do crescimento sustentável. Atualmente, a empresa convive com elevado endividamento e precisa calibrar investimentos para obter o máximo retorno financeiro, especialmente em mercados estratégicos como o da América Latina.
Essa lógica explica as escolhas técnicas do Kait. O modelo aproveita a mecânica do primeiro Kicks e não adota eletrificação, o que evidencia um projeto de custo controlado. Isso, no entanto, não significa um produto defasado. A Nissan buscou compensar a ausência de uma nova motorização com um pacote robusto de sistemas eletrônicos de assistência ao motorista, elevando o nível de segurança ativa.
Diferentemente do novo Kicks, que conquistou cinco estrelas nos testes do EuroNCAP, o Kait ainda não foi avaliado por organismos independentes de segurança. Enquanto o Kardian e o novo Kicks se beneficiam da plataforma CMF-B, com suspensões traseiras independentes que garantem elevado conforto e dirigibilidade, o Kait utiliza a plataforma V, a mesma do Kicks original, com cerca de seis anos de mercado. A suspensão traseira é por eixo rígido, solução comum na maioria dos SUVs médios vendidos no Brasil — inclusive no líder de vendas Volkswagen T-Cross, reconhecido pela boa dirigibilidade.
Por enquanto, todas as análises sobre o Kait permanecem no campo teórico. A avaliação definitiva virá após os testes práticos do modelo em CM do CP, procedimento padrão aplicado a todos os veículos analisados. Somente nos primeiros quilômetros rodados será possível medir até onde a Nissan conseguiu avançar com esse novo SUV.
A aposta no Kait também se insere em um plano mais amplo de recuperação da marca. A Nissan, que durante décadas figurou entre as dez maiores montadoras do mundo, hoje não integra sequer o grupo das 20 marcas mais valiosas globalmente. Em um cenário internacional desfavorável, o modelo deve contribuir para fortalecer a presença da empresa na América Latina, uma das regiões-chave da estratégia ARC.
Sob o comando do novo CEO, o mexicano Ivan Spinoza, a Nissan definiu que apenas uma linha de produtos renovada e verdadeiramente competitiva permitirá o reposicionamento da marca como protagonista global. O Kait surge, portanto, como um símbolo dessa transição: design futurista aliado a uma base mecânica conservadora, solução que reduziu custos de desenvolvimento e garantiu viabilidade financeira ao projeto.
Resta saber se essa economia será percebida pelo consumidor final. A resposta virá na prática, quando o Kait começar a rodar pelas ruas e estradas brasileiras e mostrar se consegue, de fato, equilibrar custo, desempenho e competitividade em um dos segmentos mais disputados do mercado automotivo.
Rádio Cidade Cruz Alta/RS