Desde a segunda metade de maio, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Rio Grande do Sul (Gaeco/MPRS) intensificou suas atividades para combater esquemas de desvio de doações destinadas às vítimas das chuvas históricas que afetaram o estado. Em diversas operações, algumas em parceria com a Polícia Civil gaúcha, os investigadores miraram pelo menos 12 pessoas envolvidas em supostos esquemas ilícitos, incluindo seis políticos e pré-candidatos às próximas eleições municipais. As operações resultaram na apreensão de centenas de donativos em quatro cidades diferentes.
Detalhes das Operações
Palmares do Sul: Desvio de Donativos e Investigação Política
Entre os dias 4 e 8 de junho, o Gaeco e a Polícia Civil realizaram duas operações em Palmares do Sul, batizadas de Desvio 1 e Desvio 2. Essas ações ocorreram no contexto de investigações sobre possíveis esquemas de desvio de donativos. Três pré-candidatos são investigados: o vereador Filipe Lang (PT-RS), pré-candidato à prefeitura do município; Polon Backes de Oliveira (União Brasil-RS), pré-candidato a vice na chapa de Lang; e o vereador Manoel Antunes Neto (PL-RS). Além deles, o secretário municipal de Administração, a esposa de um dos vereadores e um parente também estão sob investigação.
De acordo com os promotores Mauro Rockenbach e Leonardo Rossi, os donativos desviados sequer passaram oficialmente pela prefeitura. Durante as operações, a polícia apreendeu uma grande quantidade de donativos que haviam sido entregues por diversos estados brasileiros. Os itens apreendidos estavam armazenados em locais não oficiais e foram supostamente oferecidos em troca de votos.
Ao todo, foram cumpridos 15 mandados de busca e apreensão. Filipe Lang foi preso por posse irregular de arma de fogo após uma pistola ser encontrada em sua casa, mas ele já foi liberado. Em defesa nas redes sociais, Lang afirmou que a arma era uma herança de seu avô e negou qualquer envolvimento em irregularidades na distribuição de donativos.
Barra do Ribeiro: Doações Desviadas
No dia 23 de maio, o Gaeco realizou uma operação em Barra do Ribeiro após descobrir um esquema de desvio de doações destinadas à Defesa Civil do RS. As investigações revelaram que os produtos foram indevidamente entregues a uma entidade ligada a um pré-candidato às eleições municipais. Três suspeitos foram alvos de mandados de busca e apreensão, resultando na apreensão de centenas de produtos, além de documentos, celulares e mídias eletrônicas que servirão como provas para as investigações.
Eldorado do Sul: Suspeitas de Corrupção e Intervenção do Exército
No dia 25 de maio, em Eldorado do Sul, o Gaeco investigou um esquema em que os donativos eram entregues com o objetivo de obter votos. Três membros da Defesa Civil municipal, sendo dois deles pré-candidatos, estão sob investigação. Foram cumpridos nove mandados de busca e apreensão na prefeitura, em depósitos e nas residências dos suspeitos.
Dada a gravidade do caso e os fortes indícios encontrados, o Ministério Público estadual solicitou a intervenção do Exército Brasileiro na distribuição de doações às vítimas da enchente, para garantir a transparência e a correta destinação dos recursos.
Cachoeirinha: Operação e Envolvimento Político
Entre os dias 19 e 26 de maio, o Gaeco conduziu operações de busca e apreensão em um depósito ligado a uma ONG em Cachoeirinha, onde encontrou indícios de irregularidades. Os promotores identificaram uma ação criminosa com motivação política. Três suspeitos estão sendo investigados após uma denúncia apontar que uma carreta transportando donativos de outro estado foi descarregada em um local não oficial. Foram apreendidos documentos, celulares e mídias eletrônicas.
Impacto das Chuvas e Reação do Estado
Até a última atualização em 5 de junho, a Defesa Civil do Rio Grande do Sul contabilizou mais de 3,7 milhões de itens doados, incluindo garrafas de água, alimentos, cestas básicas, colchões, cobertores e material de higiene. O estado arrecadou R$ 121,5 milhões via PIX. As chuvas causaram 175 mortes confirmadas e deixaram pelo menos 38 pessoas desaparecidas, afetando 2,38 milhões de gaúchos em 478 cidades.
Declarações das Autoridades
"Não descartamos a participação de mais envolvidos. São vários os relatos da população mencionando diversos vereadores se aproveitando dessa tragédia para benefício próprio e eleitoral," afirmou o promotor Mauro Rockenbach. As investigações continuam, com foco nos crimes de apropriação indébita, peculato e associação criminosa. Procurados, os promotores do MPRS não quiseram fornecer mais detalhes sobre as investigações. A reportagem não conseguiu contato com as defesas dos demais investigados.
Com informações: Jornalista Fernando Kopper